A
Praça Portugal foi criada em 1947 e de lá para cá foi reformada várias vezes pelas
diversas administrações públicas municipais de nossa cidade. Entretanto, o que
mais vem chamando a atenção, nos últimos dias, é a notícia da total retirada de
um cartões-postais de Fortaleza, ou seja, a praça será destruída, eliminada, em
prol da melhoria da mobilidade urbana da capital. No entanto se deve parar para
refletir sobre os impactos que isso irá causar, em contrapartida ao já exposto,
que é a melhora do fluxo do trânsito, pois essa ideia já fora praticada em
outros cruzamentos nos quais havia rotatória e que estas foram extirpadas da
paisagem urbana tendo como justificativa melhorar o fluxo de carros e ônibus,
mas o que se viu foi apenas a eliminação de um ícone da memória cultural da cidade que
sempre sofre as consequências por causa daqueles que cometem
um erro para tentar soluçar um problema, ou seja, elimina-se o que em tese
causa o problema, mas não se reflete sobre o que causou o conflito inicial. Portanto,
meras resoluções paliativas, feito pseudoremédio, placebo para ludibriar a
população no intuito ou na justificativa de que se está realizando obras que
definitivamente obterão resultados positivos. Ledo engano!
No
meio de tudo isso é justo se defender a ideia de que a mobilidade urbana é um
problema que não se restringe apenas a nossa cidade, mas a todas as cidades que
se tornaram metrópoles de modo descontrolado e sem planejamentos prévios, não
se pode fugir a isso, pois o consumo, o mundo movimentado e controlado pelo
capitalismo sugere que as metrópoles estejam nesse ciclo sob a possibilidade de
estar fora dos ditos padrões de desenvolvimento e, para isso, adentra-se o
âmbito da locomoção, o trajeto que se irá utilizar, as vias, entre outros
fatores. O progresso está aí a nos rondar a todo instante, ele é necessário
para o desenvolvimento de mercado, negócios, turismo, enfim tudo o que está
ligado direta ou indiretamente à expansão de grandes centros comerciais como é
o caso de várias capitais brasileiras e as espalhadas mundo a fora. Mas a que
custo tudo isso ocorre? Não se pense aqui que há negação a todos esses
progressos, mas não são bem-vindos se locais especiais e que se referem à
memória de Fortaleza tenham que ser extirpados da paisagem urbana junto com
árvores, adornos e contornos para torná-la mais cheia de concreto, asfalto e semáforos
do que já possui. Fortaleza torna-se, aos poucos, sem os devidos cuidados, pois
se constrói, mas não se dá manutenção.
A
cidade torna-se produto do meio em que vive numa justificativa desenfreada de
que é para melhorar o nosso fluxo, mas não é, pois o alvo são os turistas, como
se a cidade fosse objeto alheio e não de quem aqui reside. Não que ela não
possa ser visitada por suas atrações diversas, mas o público-alvo deveria quem
a constrói no dia a dia, de quem por aqui estuda, trabalha, dialoga, aprecia,
não apenas para quem vem e vai, para quem apenas está de passagem. As
indagações são muitas, as respostas são poucas ou evasivas, assim como os
projetos que demandam a exclusão de locais como a Praça Portugal da nossa
vista, pois o mesmo foi outrora realizado entre os cruzamentos das avenidas 13
de maio e avenida da universidade, por exemplo, e nada mudou, pois o fluxo e a
compra de carros serão sempre superiores em locais de expansão habitacional,
comercial e turístico como é o caso aqui abordado. Mas paremos ainda mais para
pensar que nosso estado tem a cultura de não preservar sua cultura, pois tudo
aqui é esquecido pelas engrenagens do tempo que enferruja, corroi tudo ou quase
tudo o que deveria ser preservado. Há cidades brasileiras que atraem o turismo
e os negócios justamente por manterem sua perspectiva história e cultural, a memória
de seu povo por intermédios dos casarões, das praças centenárias, das árvores
colossais que atravessam os séculos na paisagem sem que ninguém as interrompam
com a serra elétrica ou o velho machado, mas nós estamos na contramão disso tudo,
tomamos o caminho do descaso, dos braços cruzados, apenas assistimos e
esperamos que meia dúzia de pessoas intercedam por nós. “Ah, já começaram as
obras? Que bom mais uma via de acesso ao que caminho que desejo!” “Ah, pararam
as obras? Nossa! Pensei que iam resolver o meu problema”. E assim caminha a
nossa metrópole que ainda é provinciana em ideologias e em muitas outras
esferas (que no momento não cabem serem mencionadas) e tenta sair deste status
sem passar pelos demais, pelos devidos caminhos, tenta a todo custo pular os
degraus, e um deles é o de devastar a memória geográfica, histórica e cultural fortalezense.
Quem
deverá se lembrar daqui a alguns anos futuros da nossa antiga praça que servia
de adorno para a cidade, que na época natalícia esbanjava sua árvore decorada
pela tradição do nascimento de Jesus? “Mas a vida é assim mesmo, cai o antigo e
se implanta o novo, o mais moderno”. E quanto a nós?! Ficamos absortos em tudo
isso? Afinal não mantemos nossos velhos casarões, não se reconhece a importância
da dança e da música cearense, nossas crianças pouco sabem sobre a história ou
a geografia do Ceará, os principais autores e produções literárias. Outro dia
escutei um jovem perguntar: “Rachel de Queiroz era de qual país mesmo?” Nossa! Para
mim foi uma facada pelas costas. E sobre Patativa do Assaré, então! “Como um homem
sem estudo escrevia tanta poesia linda?” Devo eu responder?! Talvez seja do
mesmo modo que sabendo ler, escrever e ir à escola, muitos não tenham interesse
em estudar e produzir literatura. Enfim tudo se esvai com o tempo, não se tem a
tradição da lembrança, da memória cultural, esta é sempre colocada em último
plano, pois o plano inicial é sempre o turista. Não digo todos, mas muitos só
vêm em busca do turismo sexual, que usurpa de nossas meninas e mulheres o que
para eles é “lazer”; outros tantos vêm em busca das praias que também sofrem
erosão, depreciação e são vistas como pontos de insegurança e violência. Uma das
capitais mais violentas do globo está tentando encontrar solução para um problema
antigo destruindo nossa memória cultural. “Mas é só uma praça! Bobagem!” E
depois o que virá! Os projetos implantados anteriormente podem e têm sua valia,
não se tem total contrariedade a eles, pois Fortaleza está vivendo um caos em
sua locomoção urbana, mas em contrapartida deve-se ter cuidado quando o
patrimônio cultural passa a ser visto como empecilho para essa melhoria.
Fica
a dica: reflita, antes que seja tarde!
“Ah,
e sobre o quê mesmo estávamos falando!?”
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